A discussão sobre Inteligência Artificial (IA) em Retail Media ganhou uma nova camada de profundidade. Se, como destacou Kiri Masters em “Ads AI: Older Than You Think”, a aplicação de IA em publicidade não é novidade, o momento atual redefine o papel da tecnologia: não apenas como motor de eficiência em campanhas, mas como arquitetura central da jornada omnichannel, ampliando a capacidade de monetização e elevando a experiência do shopper a um patamar preditivo e responsivo.
O Retail Rewired Report 2025 do Walmart Connect confirma essa transição. Segundo o estudo, a confiança em recomendações baseadas em IA já rivaliza com a de influenciadores digitais – um marco que evidencia a legitimação da IA como “agente de decisão” no consumo. Mais do que conveniência, trata-se de construir sistemas contextuais, personalizáveis e em tempo real, que não apenas acompanham, mas antecipam o shopper em cada etapa do funil.
A IA como motor de monetização full funnel
O Retail Media nasceu com foco na conversão, mas sua maturidade exige visão full funnel. A IA expande esse horizonte ao:
Onsite Media: algoritmos de recomendação evoluem de regras básicas para agentes generativos que personalizam vitrines digitais em tempo real, conectando inventário, dados de comportamento e contexto. Isso já é real, pode ser executado em diversos canais.
Instore Media: reconhecimento visual e agentes preditivos orquestram ativações em telas digitais ou mobile notifications, ajustando campanhas ao fluxo e perfil de shoppers capturados por mapas de calor e sensores. Muitos testes com resultados mensurados e comprovados.
Offsite Media: modelos de segmentação baseados em IA utilizam dados proprietários do varejo para escalar campanhas em mídia aberta, com maior precisão e incrementalidade comprovada. Essa segmentação vai além da entrega dos motores de machine learning.
Esse ciclo fecha um loop de monetização mais sofisticado: a IA não apenas ativa mídia, mas transforma dados de interação em novos ativos de receita – criando um modelo de Retail Media mais sustentável.
Shopper Experience: da conveniência à antecipação
De acordo com o Retail Rewired Report, 69% dos consumidores priorizam a velocidade da jornada de compra como fator decisivo sobre onde comprar. A IA entrega esse valor em três dimensões de forma muito clara:
Assistência Proativa: 47% dos consumidores aceitariam que um assistente digital realizasse compras recorrentes dentro de um orçamento definido. Isso desloca a experiência do clique para o conceito de “autonomous shopping”, com impacto direto na fidelização.
Personalização Responsiva: a linha entre relevância e invasividade é tênue. Metade dos consumidores aprecia recomendações que antecipam suas necessidades, mas 37% apontam preocupações com privacidade e excesso de direcionamento.
Confiança como moeda: privacidade, segurança e controle são condições inegociáveis. A IA deve ser transparente na coleta e uso de dados, pois apenas assim ganha legitimidade como parceiro confiável do shopper.
Diversos perfis de shopper encaram o tempo de navegação demasiadamente longa, principalmente, quando não encontram produtos de total preferência ou com preço adequado ao seu perfil de compra, independentemente do perfil (caçadores de promoção). As recomendações acabam não entregando o produto ideal, já que a descrição do produto só está configurada na mente do shopper. As buscas estáticas perderam valor com oferta qualitativa da ferramenta conversacional.
O impacto estratégico para o Retail Media no Brasil
No contexto brasileiro, onde muitas Retail Media Networks ainda operam de forma fragmentada e com baixa integração de dados, a adoção da IA pode acelerar três frentes críticas:
Integração de canais: IA conecta onsite, instore e offsite, criando jornadas contínuas e mensuráveis, superando o atual predomínio de operações isoladas.
Escalabilidade de insights: modelos generativos permitem transformar dados de CRM e de transação em segmentos de audiência dinâmicos, ampliando o poder comercial do varejo junto à indústria.
Incrementalidade comprovada: o uso de IA para testes de holdout, modelagem de atribuição e análise preditiva fortalece o argumento de investimento junto às marcas, saindo da ótica puramente de “trade budget capture”.
IA como blueprint da próxima fase
A convergência dos insights de Kiri Masters e do Retail Rewired Report do Walmart conecta indica que a IA não é mais um acessório, mas o núcleo do Retail Media moderno. Ela redefine a lógica de monetização, cria novas frentes de receita baseadas em dados e, sobretudo, ressignifica a experiência do shopper em todo o funil: da descoberta à recompra. Isso precisa ser melhor discutido com mais profundidade entre os agentes de RMNs e marcas anunciantes.
No Brasil, onde ainda há lacunas de maturidade, a adoção de IA representa um divisor de águas: não apenas para capturar eficiência operacional, mas para construir ecossistemas de Retail Media centrados no shopper e orientados por confiança. A pauta IA ainda não foi introduzida com prioridade nas operações de RMNs no Brasil, precisamos de visão estratégica mais aprimorada para não depender de soluções fechadas (“caixa preta”) das big techs.
Em última análise, a IA inaugura uma era de Retail Media preditivo, no qual cada ponto de contato é um ativo de monetização e cada interação é uma oportunidade de criar valor mútuo – para as RMNs, para as marcas e, principalmente, para o shopper. As dores da jornada em diversos perfis de shopper ainda não são exaustivamente discutidas entre as marcas anunciantes nessa nova era de IA aplicada em Retail Media.