O que está em curso é uma transição, na qual saímos de um marketing baseado em impressões para um marketing que considera como o cérebro realmente reage
Autor: Ricardo Vieira
Por muito tempo, medimos o sucesso de uma campanha publicitária pela conversão no final do funil. Mas e se o que realmente define o impacto de um anúncio acontecer nos primeiros segundos de exposição — quando o cérebro ainda está formando a memória, mesmo antes da intenção de compra se manifestar?
É isso que a neurociência aplicada ao varejo nos mostra. E não estamos falando de teoria: são aplicações práticas, já testadas por marcas, plataformas e consultorias que buscam compreender não apenas o que o consumidor faz, mas como ele sente, reage e decide.
Estudos com eye-tracking (rastreamento ocular) demonstram que a atenção do consumidor pode ser dirigida com precisão ao ajustar posicionamento, cores e movimento de peças publicitárias no ponto de venda. A combinação entre atenção visual e excitação emocional tem se mostrado determinante para a eficácia de campanhas em ambientes de varejo, digitais ou físicos, como mostram os estudos publicados no Frontiers in Psychology, 2021 e no Journal of Retailing, 2024.
A tecnologia de fMRI (ressonância magnética funcional) tem permitido mapear quais áreas do cérebro são ativadas por estímulos publicitários visuais e auditivos. Isso permite identificar, com base biológica, quais anúncios têm mais chance de serem lembrados — e, portanto, influenciar decisões de compra futuras, como detalha o estudo The Emotional Effectiveness of Advertisement, do Frontiers in Psychology, 2020.
A NielsenIQ, por exemplo, já conduz pesquisas que mostram que anúncios que combinam imagem, som e movimento ativam áreas cerebrais ligadas à emoção e à memória de longo prazo com até 25% mais eficiência do que anúncios estáticos. Essa diferença se traduz em mais retenção da mensagem e maior influência sobre o comportamento de compra.
Outro avanço relevante vem do uso de expressões faciais para mensurar emoções em tempo real. Softwares de reconhecimento facial analisam micro expressões para identificar sentimentos como surpresa, alegria, desinteresse ou aversão. Esses dados, quando aplicados em testes de campanha, ajudam a refinar mensagens antes mesmo de irem ao ar.
A neurociência também tem revelado que o momento do dia em que o consumidor é impactado interfere em sua receptividade. Por exemplo, o cérebro está mais propenso a aceitar estímulos emocionais à noite — e mais analítico pela manhã, uma descoberta associada ao chamado ritmo circadiano. Plataformas e redes de varejo que ajustam suas campanhas com base nesses ciclos já colhem ganhos em engajamento e conversão.
No Brasil, onde 85% das vendas ainda ocorrem em lojas físicas, a oportunidade de usar estímulos sensoriais de forma coordenada — como som, imagem e interação tátil — ainda está em fase inicial. Enquanto redes globais testam experiências multissensoriais com base em dados neurocientíficos, muitas redes regionais sequer começaram a explorar esse caminho.
O que está em curso é uma transição: saímos de um marketing baseado em impressões para um marketing que considera como o cérebro realmente reage. A boa notícia é que isso já está ao alcance de quem quer inovar — seja em escala nacional ou regional. É um fato que essa convergência entre neurociência, tecnologia e varejo não é mais uma tendência — é uma realidade que redefine a maneira como campanhas são pensadas, executadas e avaliadas. A lógica da publicidade baseada em impressões começa a dar lugar à publicidade baseada em reações reais do cérebro humano.
Ricardo Vieira é especialista em varejo e idealizador do Retail Media Show.
Fonte: CLIENTE SA